sábado, 7 de abril de 2012 0 comentários

A Inveja

A inveja habita no fundo de um vale onde jamais se vê o Sol. nenhum vento o atravessa; ali reinam a tristeza e o frio, jamais se acende o fogo, há sempre trevas espessas (...). A palidez cobre seu rosto, seu corpo é descarnado, o olhar não se fixa em parte alguma. Tem os dentes manchados de tártaro, o ventre esverdeado pela biles, a língua úmida de veneno. Ela ignora o sorriso, salvo aquele que é excitado pela visão da dor (...). Assiste com despeito ao sucesso dos homens e esse espetáculo a corrói; ao dilacerar os outros, ela se dilacera a si mesma, e este é seu suplício.
Texto Metamorfoses
Ovídio
sexta-feira, 6 de abril de 2012 0 comentários

Feliz Páscoa !

Feliz Páscoa!
 © Letícia Thompson
 

Festa da primavera para os pastores nômades na época pré-mosaica, festa dos hebreus que comemora a saída do Egito e festa da ressurreição de Cristo para os cristãos, o sentido da Páscoa se perdeu ao longo dos anos para as civilizações modernas e ocidentais. 
Nós guardamos a Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo como símbolo de perdão, libertação e demonstração do grande amor de Deus para que uma vez mais os homens se reconciliem com Ele. Se os judeus sacrificam cordeiros, nós temos um que foi sacrificado uma única vez para que através desse sacrifício pudéssemos voltar ao Pai.
Páscoa para nós é isso então: não uma festa onde distribuímos ovos de chocolate, mas uma festa onde podemos sentir nos nossos corações que um dia um Homem foi capaz de dar a Sua vida pelo amor de todos nós. Por  que Cristo não morreu só para os cristãos, o sacrifício foi por todos, indistintamente. E cada vez que trocamos o verdadeiro sentido da nossa Páscoa por tradições que nos fazem esquecer dessa verdade, crucificamos Cristo uma vez mais.
Não há nada de errado em oferecer chocolate para amigos e crianças. Desenhar coelhinhos que simbolizam a fertilidade não é nada demais também. O que não podemos é nos esquecer de transmitir aos outros a grande verdade do Amor de Deus de que Cristo veio para nos libertar de uma escravidão que muitos teimam em continuar presos.  Se não somos felizes, se ainda estamos presos a coisas que nos impedem de ser livres, é porque não olhamos o suficiente para a Cruz de Cristo e para o túmulo vazio.
Páscoa é sobretudo uma festa de perdão! Que possamos pensar nisso. Não somente para aceitar aquele que nos foi oferecido, mas para dar aos que precisam do nosso, com o coração aberto, sincero e... quem sabe nas mãos um bonito, colorido e gostoso ovo de chocolate?!
Desejo a você uma linda Páscoa!!!

Letícia Thompson
quarta-feira, 28 de março de 2012 0 comentários

EROS E PSIQUE

EROS E PSIQUE
Conta a lenda que dormia
uma Princesa encantada 
A quem só despertaria 
Um Infante, que viria 
De além do muro da estrada
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem, 
Antes que, já libertado, 
Deixasse o caminho errado 
Por o que à Princesa vem.
A Princesa adormecida,
Se espera, dormindo espera, 
Sonha em morte a sua vida, 
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera. 

Longe o Infante, esforçado, 
Sem saber que intuito tem, 
Rompe o caminho fadado, 
Ele dela é ignorado, 
Ela para ele é ninguém.
Mas cada um cumpre o Destino - 
Ela dormindo encantada, 
Ele buscando-a sem tino 
Pelo processo divino 
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro 
Tudo pela estrada fora, 
E falso, ele vem seguro, 
E vencendo estrada e muro, 
Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera, 
À cabeça, em maresia, 
Ergue a mão, e encontra hera, 
E vê que ele mesmo era 
A Princesa que dormia.

Fernando Pessoa
sábado, 17 de março de 2012 0 comentários

Silêncio

Silêncio

Clarice Lispector

É tão vasto o silêncio da noite na montanha. É tão despovoado. Tenta-se em vão trabalhar para não ouvi-lo, pensar depressa para disfarçá-lo. Ou inventar um programa, frágil ponto que mal nos liga ao subitamente improvável dia de amanhã. Como ultrapassar essa paz que nos espreita. Silêncio tão grande que o desespero tem pudor. Montanhas tão altas que o desespero tem pudor. Os ouvidos se afiam, a cabeça se inclina, o corpo todo escuta: nenhum rumor. Nenhum galo. Como estar ao alcance dessa profunda meditação do silêncio. Desse silêncio sem lembranças de palavras. Se és morte, como te alcançar.
É um silêncio que não dorme: é insone: imóvel mas insone; e sem fantasmas. É terrível - sem nenhum fantasma. Inútil querer povoá-lo com a possibilidade de uma porta que se abra rangendo, de uma cortina que se abra e diga alguma coisa. Ele é vazio e sem promessa. Se ao menos houvesse o vento. Vento é ira, ira é a vida. Ou neve. Que é muda mas deixa rastro - tudo embranquece, as crianças riem, os passos rangem e marcam. Há uma continuidade que é a vida. Mas este silêncio não deixa provas. Não se pode falar do silêncio como se fala da neve. Não se pode dizer a ninguém como se diria da neve: sentiu o silêncio desta noite? Quem ouviu não diz.
 A noite desce com suas pequenas alegrias de quem acende lâmpadas com o cansaço que tanto justifica o dia. As crianças de Berna adormecem, fecham-se as últimas portas. As ruas brilham nas pedras do chão e brilham já vazias. E afinal apagam-se as luzes as mais distantes.
 Mas este primeiro silêncio ainda não é o silêncio. Que se espere, pois as folhas das árvores ainda se ajeitarão melhor, algum passo tardio talvez se ouça com esperança pelas escadas.
 Mas há um momento em que do corpo descansado se ergue o espírito atento, e da terra a lua alta. Então ele, o silêncio, aparece.
 O coração bate ao reconhecê-lo.
 Pode-se depressa pensar no dia que passou. Ou nos amigos que passaram e para sempre se perderam. Mas é inútil esquivar-se: há o silêncio. Mesmo o sofrimento pior, o da amizade perdida, é apenas fuga. Pois se no começo o silêncio parece aguardar uma resposta - como ardemos por ser chamados a responder - cedo se descobre que de ti ele nada exige, talvez apenas o teu silêncio. Quantas horas se perdem na escuridão supondo que o silêncio te julga - como esperamos em vão por ser julgados pelo Deus. Surgem as justificações, trágicas justificações forjadas, humildes desculpas até a indignidade. Tão suave é para o ser humano enfim mostrar sua indignidade e ser perdoado com a justificativa de que se é um ser humano humilhado de nascença.
 Até que se descobre - nem a sua indignidade ele quer. Ele é o silêncio.
 Pode-se tentar enganá-lo também. Deixa-se como por acaso o livro de cabeceira cair no chão. Mas, horror - o livro cai dentro do silêncio e se perde na muda e parada voragem deste. E se um pássaro enlouquecido cantasse? Esperança inútil. O canto apenas atravessaria como uma leve flauta o silêncio.
 Então, se há coragem, não se luta mais. Entra-se nele, vai-se com ele, nós os únicos fantasmas de uma noite em Berna. Que se entre. Que não se espere o resto da escuridão diante dele, só ele próprio. Será como se estivéssemos num navio tão descomunalmente enorme que ignorássemos estar num navio. E este singrasse tão largamente que ignorássemos estar indo. Mais do que isso um homem não pode. Viver na orla da morte e das estrelas é vibração mais tensa do que as veias podem suportar. Não há sequer um filho de astro e de mulher como intermediário piedoso. O coração tem que se apresentar diante do nada sozinho e sozinho bater alto nas trevas. Só se sente nos ouvidos o próprio coração. Quando este se apresenta todo nu, nem é comunicação, é submissão. Pois nós não fomos feitos senão para o pequeno silêncio.
 Se não há coragem, que não se entre. Que se espere o resto da escuridão diante do silêncio, só os pés molhados pela espuma de algo que se espraia de dentro de nós. Que se espere. Um insolúvel pelo outro. Um ao lado do outro, duas coisas que não se vêem na escuridão. Que se espere. Não o fim do silêncio mas o auxílio bendito de um terceiro elemento, a luz da aurora.
 Depois nunca mais se esquece. Inútil até fugir para outra cidade. Pois quando menos se espera pode-se reconhecê-lo - de repente. Ao atravessar a rua no meio das buzinas dos carros. Entre uma gargalhada fantasmagórica e outra. Depois de uma palavra dita. Às vezes no próprio coração da palavra. Os ouvidos se assombram, o olhar se esgazeia - ei-lo. E dessa vez ele é fantasma.

Clarice Lispector- "Onde estivestes de noite?"
7ª Ed. - Ed. Francisco Alves - Rio de Janeiro - 1994
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As Palavras

As palavras verdadeiras não são bonitas,
as palavras bonitas não são verdadeiras.

A habilidade não é persuasiva,
a persuasão é destituída de mérito.

O Sábio não é erudito,
o erudito não é sábio.

O Sábio não acumula posses.
Quanto mais ele faz para os outros,
mais ele possui.
Quanto mais dá aos outros,
mais ele recebe.

O Tao do Céu "favorece sem prejudicar".
O Tao do Sábio é "agir sem lutar"
sábado, 10 de março de 2012 0 comentários

Pensamento do Dia 31#

e dois homens vêm andando por uma estrada, cada um com um pão, e, ao se encontrarem, trocarem os pães, cada um vai embora com um.
Se dois homens vêm andando por uma estrada, cada um com uma idéia, e, ao se encontrarem, trocarem as idéias, cada um vai embora com duas."
Provérbio chinês
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Para Sempre

Para Sempre

Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.

Morrer acontece
com o que é breve e passa
sem deixar vestígio.
Mãe, na sua graça,
é eternidade.
Por que Deus se lembra
- mistério profundo -
de tirá-la um dia?
Fosse eu Rei do Mundo,
baixava uma lei:
Mãe não morre nunca,
mãe ficará sempre
junto de seu filho
e ele, velho embora,
será pequenino
feito grão de milho. "
Carlos Drummond de Andrade
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