terça-feira, 30 de julho de 2013

UMA JANELA PARA A FILOSOFIA Parte IV



No dia seguinte, repetiu-se a mesma coisa. O rapaz era insistente. A curiosidade para
ele era como um vício difícil de abandonar.
- Posso pegar um livro, seu Américo?
Ainda não.
- Mas tem vários sobre filosofia aí, porque eu não posso ler?
- Você me pediu uma coisa. Queria aprender filosofia. Se quer aprender com os livros,
basta comprá-los.
O rapaz desconcertou-se. Na sala a mesma cena dos dias anteriores. O jovem em
frente à janela e o velho na escrivaninha praticamente não se comunicava. Na cabeça
do rapaz pairavam as dúvidas do dia anterior. “Por que a cor branca do lado direito das
árvores? Por que aquela correnteza forte? Por que a chuvinha que não pára?”... “Por
que a cor branca nas árvores, a correnteza, a chuvinha? Cada vez mais seus olhos se
prendiam na janela. “Por que a cor branca? Por que a correnteza? Por que a
chuvinha?”... “A cor branca, a correnteza a chuvinha...” Aquelas dúvidas na cabeça, a
janela imóvel postando-se entre ele e a imponência da paisagem e o silêncio
enigmático do velho deixavam o rapaz extremamente irritado e incomodado. “Paisagem
com árvores com cor branca por quê? Por que correnteza forte e chuvinha que não
pára?”
E olhava a janela irritado. “Cor branca correnteza... chuvinha...” “Por que a paisagem é
assim?” “Cor branca, correnteza e chuvinha. A janela... a paisagem. O velho não fala
nada...” Sua mente estava a ponto de se desorientar. Suas perguntas ribombavam
como vozes que ecoavam em seu cérebro: “Por que a cor branca nas árvores? Por que
a correnteza forte do rio? Por que a chuva fina não cessa? O jovem ia se agastando,
mas as questões permaneciam, como se tivessem vida própria. “Por que a cor branca,
por que correnteza forte, por que chuvinha incessante... Por quê? Cor branca...”
Tomado por uma raiva súbita e explosiva que o fez agir quase que inconscientemente,
o rapaz pegou um banquinho que estava na sala e atirou-o contra o vidro da janela
com toda a força. Os estilhaços se espalharam por dentro e por fora da casa. Não
sobrou quase nada da vidraça. O barulho chamou a atenção do velho que, após um
sobressalto, voltou-se calmamente para trás. Viu o jovem de pé, arfando, com o
desespero estampado em seu semblante. O velho fitava-o enternecido, com um
aspecto paternal. Sua feição confundiu ainda mais o jovem, que esperava algum tipo
de repreensão.
- Seu Américo, desculpa... Eu não sei o que dizer, meu Deus... – Vou dar um jeito de
limpar... É que...
O velho sorriu mais uma vez.
- Não vai até lá? Perguntou o filósofo.
O rapaz ficou confuso.
Vá, vá olhar.
O visitante titubeou, mas foi até a janela destruída. Seus tênis fizeram estalar alguns
cacos pelo chão. Parou, olhou novamente o velho e depois enfiou cuidadosamente a
cabeça para fora da janela, evitando encostar nos cacos de vidro restantes.
A visão que teve foi como o ascender das luzes em uma festa surpresa, onde a
curiosidade proporcionada pela escuridão é satisfeita pela aparição do bolo, dos
parentes, dos amigos, dos enfeites, etc. A paisagem que o jovem via antes através do
vidro pareceu esticar-se ao infinito, possibilitando que ele contemplasse as respostas
para aqueles seus questionamentos.
Do lado contrário à correnteza do rio, bem próximo da casa, uma bela cachoeira
lançava suas águas sobre algumas pedras mais salientes da pequena montanha. Com
a força da queda, a água espirrava longe e molhava, como uma chuva fina, a relva nas
imediações. “Era por isso a correnteza forte! E a chuva não é chuva, são respingos!

Por isso não cessa!” A descoberta fez o jovem regozijar-se.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Lomadee, uma nova espécie na web. A maior plataforma de afiliados da América Latina.
 
;